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Cinco violações na área de Lisboa numa semana. Coincidência?

Queluz, Cacém, Sacavém, Cais do Sodré, Av. da Liberdade... 5 crimes, 5 vítimas, mas provavelmente agressores diferentes. A violação foi o crime violento que mais subiu

O último caso aconteceu na quinta-feira à noite em Sacavém, quando uma mulher jovem foi violada numa paragem de autocarro. Desde 25 de agosto, há notícias de cinco crimes de violação sexual, em locais diferentes e com diferentes personagens na região de Lisboa.

Além de Sacavém, Queluz e Cacém foram denunciados dois crimes em Lisboa, estes últimos envolvendo duas turistas, no Cais do Sodré e num hotel da Avenida da Liberdade. Apesar da criminalidade violenta ter diminuído, os crimes de violação sexual estão em contraciclo – segundo o Relatório Anual da Segurança Interna RASI), no ano passado aumentaram 21,8%, tendo ultrapassado a barreira dos 400 casos.

Coincidência estas violações terem acontecido na mesma semana? Coincidência terem sido noticiadas? Para Rui Abrunhosa Gonçalves, professor de Psicologia da Universidade do Minho e especialista em comportamentos desviantes, ainda que haja épocas que possam propiciar este tipo de casos, quando há maior ingestão de álcool, numa situação destas o que interessa perceber é se são pessoas diferentes. Não o sendo, não se está perante um violador em série. “O violador, se não for tratado, tende a repetir os atos. É muito importante perceber se tem cadastro”, afirma o psicólogo forense. Um dos casos mais conhecidos em Portugal é o do violador de Telheiras.

As autoridades acreditam que se trata de diferentes agressores, até porque já houve detenções. Mas nos casos da linha de Sintra há um pormenor em comum: terem acontecido junto à estação do comboio.

Os cinco casos

O agressor de Sacavém pôs-se em fuga depois de ter violado uma mulher, quando ouviu que estava alguém a aproximar-se. Primeiro, aproximou-se e ter-lhe-á perguntado a que horas era o último autocarro; depois pediu-lhe o telemóvel para fazer uma chamada e, perante a recusa, agarrou-a e e violou-a.

No dia anterior, quarta-feira, uma jovem foi violada no Cacém sendo que o suspeito – que também estava em fuga – já foi detido pela Polícia Judiciária. Eram cerca das 23.00 quando o homem, encapuzado, se aproximou da mulher de 26 anos numa zona habitacional entre a Rua Luís de Camões e a Rua Almeida Garret. Depois fugiu em direção à estação.

Na zona de Sintra, em Queluz, há ainda notícias de outras duas violações, no espaço de uma semana. E ainda que as autoridades apontem para agressores diferentes, em comum há o facto de terem acontecido próximo à estação dos comboios: no sábado, uma mulher foi abordada por um homem que a assaltou e asfixiou até esta desmaiar. Terá sido violada enquanto estava inconsciente. Outra mulher terá apresentado queixa por violação.

“Há uma onda complicada deste tipo de crimes e estamos a ficar preocupados”, disse ao DN uma fonte policial daquela zona.

Esta terá sido a quinta violação na Grande Lisboa no prazo de uma semana. No sábado, duas turistas foram violadas: uma, de 22 anos, numa discoteca do Cais do Sodré e a outra, de 28, num hotel da Avenida da Liberdade. Ambos os agressores foram detidos, sendo que o suspeito do crime ocorrido no hotel é estrangeiro.

Porque sobem as estatísticas

A violação foi o crime que mais aumentou em Portugal em 2017, segundo Relatório Anual de Segurança Interna (RASI). Ao todo, foram reportados 408 crimes de violação, mais 73 que em 2016 (nesse ano foram 335). Este é o valor mais alto registado nos relatórios de segurança interna desde 2010. No âmbito dos crimes sexuais, 18,7% dos inquéritos iniciados disseram respeito a violações.

Apesar de se registar um aumento dos casos denunciados, Rui Abrunhosa Gonçalves faz questão de sublinhar que neste tipo de crime “bastante complexo” as estatísticas não são completamente fiáveis, uma vez que muitas vítimas ainda optam por não denunciar os agressores. Ou, quando o fazem, acabam por não querer que o caso avance nos tribunais. Porque sabem que é muito difícil fazer a prova, sobretudo quando são agredidas por pessoas com quem possam ter tido algum tipo de relacionamento.

“Muitas vezes pelo facto de terem consumido álcool, até por influência do violador, as vítimas são descredibilizadas. Há um contacto sexual, e ele diz que foi consentido, e a vítima como bebeu, ou não se lembra de todos os factos ou a sua versão acaba por ser dúbia”, refere o especialista.

” O agressor pode ficar calado mas a vítima vai ter que responder a tudo, ao juiz, ao procurador, ao advogado”

Apesar de muitas vítimas não se sentirem protegidas pelo sistema, as denúncias de crimes sexuais têm vindo a aumentar. Tal como aconteceu com a violência doméstica. “À medida que se toma mais consciência da gravidade do problema, que há mais proteção legal, as pessoas denunciam mais”, refere Nuno Abrunhosa Gonçalves.

Mas há ainda muita gente que cala a vergonha de ver a sua vida íntima exposta nos tribunais. “As vítimas não se sentem protegidas pelo sistema. O agressor pode ficar calado mas a vítima vai ter que responder a tudo, ao juiz, ao procurador, ao advogado. E o advogado de defesa vai tentar tudo para provar que a mulher é leviana, promíscua.”

Ao embaraço acresce o descrédito na justiça, justificado pelas estatísticas e pelo número reduzido de detidos: segundo o RASI, foram detidos apenas 53 agressores, todos do sexo masculino. “Há um desfasamento muito grande entre o número de casos denunciados e as condenações com pena de prisão”, sublinha Abrunhosa Gonçalves.

De acordo com o RASI, os arguidos são esmagadoramente do sexo masculino: 99,2%. Já as vítimas são maioritariamente do sexo feminino (90,7%).

Origem
DN
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