Política

Marcelo brinda João Lourenço com “discurso do coração”: “Sem cura para esse mal que nos condena a estarmos juntos”

A fechar o primeiro dia da visita do Presidente de Angola a Portugal, um dia cheio de mensagens políticas, Marcelo Rebelo de Sousa escolheu puxar pelo “coração”. Mais do que “uma parceria”, mais do que acordos assinados, Marcelo pediu uma “cumplicidade estratégica” para aproveitar “um horizonte que pode ser irrepetível”

Foi poético e empático o discurso que o Presidente da República dedicou ao Presidente de Angola no jantar que lhe ofereceu no palácio da Ajuda, em Lisboa.

A fechar (e a aliviar?) um dia marcado por discursos carregados de mensagens políticas para consumo em Lisboa e em Luanda, Marcelo Rebelo de Sousa decidiu puxar pelos laços afetivos, em nome do que chamou “uma cumplicidade estratégica”, em que “cada um siga o seu caminho, mas os dois sabendo não poder desperdiçar um horizonte que pode ser irrepetivel”.

“Há dois discursos possiveis” , afirmou o Presidente, “um é o da razão, o outro o do coração”. Marcelo escolheu os dois mas puxou pelo segundo, apostado em valorizar aquela que não disfarça considerar a principal mais valia específica na relação histórica entre os dois países.

O discurso da razão, explicou o Presidente, encontra justificação para uma reforçada cooperação bilateral na própria “evidência dos factos”. E que factos são esses? É o mundo atual, “exigindo-nos reforçada cooperação pela paz, pelo desenvolvimento sustentável, pelos direitos humanos, pela justiça social, contra a corrupção, pelo ambiente, pelos refugiados, pelo multilateralismo, pela saúde, pela educação, pela inovação”.

Num momento em que Angola “se afirma pela credibilidade e influência crescente na cena internacional”, e Portugal soma a presença de “alguns dos seus melhores em posições de liderança em organizações internacionais” (ONU/Eurogrupo), Marcelo defende que o contexto “convida à convergência mais forte” entre os dois países. E lembra que António Guteres, eleito com o apoio de Angola para secretário geral da ONU “é conhecido pela relevância que atribui a África”, com quem partilhamos “um oceano e a língua”.

“Com júbilo acompanhamos o vosso percurso externo”, afirmou o Presidente da República, já a guinar para o discurso do coração: “O vosso sucesso é o nosso sucesso, tal como temos a certeza que o nosso sucesso é sentido também como vosso”.

No discurso “da razão” ainda couberam “os interesses comuns que ditam os acordos amanhã assinados nas áreas da educação, cultura, justiça, economia”, assim como “a confiança reforçada de trabalhadores e empresários de um e de outro lado e da vontade de diversificarem e acelerarem projetos e investimento”. Tudo isto num momento que Marcelo referiu como “podendo ser único para muito mais do que uma parceria”. Para “uma cumplicidade estratégica” acente “numa sábia lucidez e uma fria perceção da realidade”.

“Há no entanto um outro discurso”, e o Presidente dos afetos queria muito lá chegar: “o discurso do coração, mais querido dos povos do que dos que decidem, um discurso com irreprimíveis razões, que nos levam a alegrar e a zangar na mesma lingua a prometer ruturas eternas para logo penar de saudades”.

Sem falar da última zanga bilateral, o “irritante” que João Lourenço dissera horas antes estar “definitivamente” ultrapassado, Marcelo Rebelo de Sousa falou dos dois países como uma dupla “sem cura já para esse mal que nos condena a estarmos juntos, mesmo quando julgamos que só somos felizes e plenamente realizados no nosso amor próprio ao nos ignorarmos”.

Faltava o remate final: “Hoje quem vos acolhe é muito mais do que o titular da PR, quem vos acolhe é o representante de todo o povo português e é todo ele que sauda o povo angolano, o seu forte caráter e identidade, a sua vincada personalidade e a sua saga de antes, durante e para lá dos tempos que vivemos”.

O presidente pediu aos convidados que erguessem as taças num brinde “pelo futuro”. O primeiro dia do “novo ciclo” terminou,assim, sob o signo da argamassa em que Marcelo mais confia para a parceria com Angola: afetos e “coração”.

Origem
Expresso
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